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Fernando Gabeira
(A fotobiografia "Fernando Henrique Cardoso - 80 anos" - Ed. Jatobá -, organizada por Hubert Alquéres, será lançada nesta quarta-feira (14), às 19h, na Livraria Cultura do Conjunto Nacional, em São Paulo. O prefácio de Fernando Gabeira é publicado especialmente por Terra Magazine).
Biografias visuais de um presidente, como esta de Fernando Henrique Cardoso, são muito importantes para quem estuda o país. Costumam ser raras também. O que comumente acontece é aparecer o livro de um só fotógrafo, free-lancer ou contratado da presidência, contando, em imagens, a história do mandato.Há casos em que a proximidade do fotógrafo e do político permite uma cobertura mais longa. Foi o que aconteceu por 30 anos com Miterrand, um livro de Pascal Lebrun que cobre a vida do presidente francês desde 1972.
Mas o próprio autor reconhece que, ao se tornar presidente, Francois Miterrand não era mais acessível como antes. As reportagens tornaram-se mais difíceis e esparsas. No caso deste livro, as fotos publicadas cobrem parte da infância com a família, os anos de intelectual voltado para o trabalho teórico, as responsabilidades de um Presidente da República e, depois disso, inúmeras amizades e compromissos que o mostram como um cidadão do mundo.
A primeira utilidade desta biografia visual é esta: recheada com um grande número de fotos de situações históricas do país, pode ser vista como um amplo documento sobre o Brasil contemporâneo.
Apesar de estáticas, as imagens também podem ser lidas como o roteiro de um documentário sobre o Brasil moderno, desde que acrescentadas também do rico material filmado que existe sobre os oito anos do governo de Fernando Henrique Cardoso.
Os organizadores do livro, como não podia deixar de ser, tinham um plano que se desdobra ao longo da vida de Fernando Henrique cronologicamente. Mas o leitor que o conhece, ou que apenas tem vontade de conhecê-lo melhor, é livre para realizar seus próprios arranjos, responder, através da sua própria organização das fotos, às perguntas que ainda tem sobre a vida desse intelectual que se tornou político, internacionalmente, admirado.
Num grupo de meninos com suas roupas de banho, era possível, agora, estabelecer o nexo entre o prazer da infância e o esporte que ele escolheu como presidente: a natação. O que era puro prazer tornou-se, na idade adulta, depois de anos de estudos e centenas de reuniões políticas, a terapia que o ajudou a manter a forma e o vigor, aos 80 anos de idade.
O livro nos transporta também para a leveza e a elegância dos jovens Fernando e Ruth, às voltas com a teoria e a pesquisa, possivelmente uma ou outra querela acadêmica. Nada parecido com o que iriam enfrentar: as responsabilidades da presidência e a aspereza dos adversários políticos.
Mesmo as diferenças políticas, entretanto, podem suscitar um bom arranjo na biografia visual de Fernando Henrique. Nela, o vemos ao lado de Lula distribuindo jornais em porta de fábrica e, depois, depois o vemos, mais tarde, transmitindo a presidência da República para o parceiro das lutas de rua. O que se ressalta também ao longo das imagens é a confiança que os intelectuais e artistas depositaram nele. Era um momento da história em que ele representava não só processo de democratização que estava em curso, mas uma lufada de ar puro numa atmosfera política carregada pelo peso da ditadura militar e povoada por fantasmas que se recusavam a desaparecer.
Lembro-me de ter participado de uma caravana que foi, especialmente, a São Paulo para apoiar sua candidatura a prefeito. Derrotado nas urnas, parecia com poucas chances no futuro.
Alguns anos depois, lá estava ele na presidência da República, um pouco sobrecarregado pelo peso da responsabilidade e a liturgia do cargo, mas sem nunca ter perdido o bom humor e o interesse por uma boa conversa.
Eu o conheci no exílio, em Berlim. Ele foi fazer uma palestra sobre o Brasil, no Instituto Latino Americano, na Breitenbachplatz. Foi um bálsamo para todos os que ouvíamos as palestras ali. Fomos soterrados por análises econômicas, na suposição de que toda a compreensão do mundo decorria daí. Fernando Henrique falou de política, cultura, economia, enfim, abriu janelas fechadas por um marxismo reducionista.
Um pequeno grupo de asilados o convidou para continuar a conversa e falamos toda a madrugada, sem que ele tivesse ideia de nossa identidade real. Éramos clandestinos em Berlim. Não há fotos desse encontro. Mas olhando a sucessão de imagens sobre o desenrolar de sua vida, é fácil compreender como foi interessante e produziu um homem generoso.
E ainda por cima, com a sorte de ter encontrado e se casado com Ruth.
Veja também:
» Livro sobre FHC resgata história da República brasileira em fotografias, conta Hubert Alquéres
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http://terramagazine.terra.com.br/interna/0,,OI5517084-EI6578,00-Gabeira+FHC+abriu+janelas+fechadas+por+marxismo+reducionista.html
quinta-feira, 15 de dezembro de 2011
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