Pôster do filme “Criação” (Creation) - baseado no livro “Annie’s Box”, escrito por Randal Reynes, tataraneto de Charles Darwin, o criador da teoria da evolução.

segunda-feira, 11 de outubro de 2010

Aborto é ícone da extrema direita nos Estados Unidos


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Carlos Drummond
De Campinas (SP)

O tema do aborto, destacado nas eleições presidenciais brasileiras pela oposição e assumido pelos governistas em posição defensiva, é o maior ícone da direita nos Estados Unidos e foi o centro do movimento que, em 2004, canalizou votos de trabalhadores para George W. Bush. Para afastar eleitores de baixa renda do candidato democrata, os republicanos se apresentaram como defensores dos oprimidos e de valores tradicionais, mas visavam, de fato, destruir as conquistas sociais dos anos 1960 e 1970 e do período do New Deal do presidente Franklin Delano Roosevelt.

A estratégia reacionária, conhecida como The Great Backlash, definia como centro da política a luta cultural e ideológica por valores. Os republicanos, em especial os radicais, apresentavam-se como defensores da fé, da família e da liberdade, que diziam ameaçadas pelos democratas. Senadores republicanos exortavam o eleitorado a vencer a guerra cultural ao aborto, ao casamento de homossexuais e também ao controle de armas, à taxação dos ganhos de capital, à proteção da saúde pelo Estado.

Segundo o jornalista Frank Thomas, autor de livro que descreve como os conservadores conquistaram uma parte expressiva do eleitorado democrata dos Estados Unidos, a campanha republicana contra o aborto, o controle de armas e toda forma de arte considerada contrária aos preceitos do cristianismo elegeu candidatos que, uma vez empossados, não levaram adiante suas propostas religiosas e culturais e se empenharam em defender os interesses das grandes empresas. Os líderes do movimento Backlash falam de Cristo, mas praticam os interesses das grandes empresas, afirmou Thomas. A vitória contra o aborto prestou-se, na prática, para diminuir os impostos para as grandes empresas e barrar medidas de interesse das parcelas pobres da população.

O estratagema funcionou perfeitamente em benefício dos republicanos e das grandes corporações. O voto contra o aborto e em favor do fortalecimento do país, contra os professores politicamente corretos das universidades e pela redução do papel do governo resultou em redução dos impostos sobre ganhos de capital, desindustrialização, desregulamentação da área de energia - com resultados como o escândalo da Enron -, conglomerização e monopólio em quase todo os setores empresariais, inclusive na mídia, ações pela privatização da seguridade social e concentração de renda sem precedentes, com achatamento salarial e elevação da remuneração dos executivos a patamares nunca vistos.

As pessoas não sabiam que estavam sendo manipuladas. Acreditavam na sinceridade das propostas conservadoras dos republicanos, que correspondiam aos seus temores mais profundos.

O movimento conservador americano, que herdou valores do racismo, polariza hoje posições contra o casamento de homossexuais, entre outras. A defesa do aborto se presta até hoje, nos Estados Unidos, para alinhar a elite contra o povo, constituindo um marco do confronto de classes. Na base do conflito está, de um lado, a defesa de liberdade irrestrita para as empresas e o mercado, de outro, a defesa da propriedade pública, dos sindicatos e o combate aos monopólios.

Carlos Drummond é jornalista.
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http://terramagazine.terra.com.br/interna/0,,OI4726774-EI6609,00-Aborto+e+icone+da+extrema+direita+nos+Estados+Unidos.html

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